Dados de um estudo da Sociedade Internacional de Próteses, mostraram que cerca de 57 milhões de pessoas viviam com uma amputação em 2017 sendo as principais causas da amputação: quedas (36,2%), acidentes de trânsito (15,7%), outros acidentes de transporte (11,2%) e forças mecânicas (10,4%). Nos Estados Unidos, 1 em cada 200 pessoas é amputada, sendo que esse valor pode dobrar até 2050, sendo a Diabetes associada a complicações vasculares uma das principais causas de amputações. No Brasil, segundo dados da ONU – Organização das Nações Unidas, 70% das amputações são decorrentes da Diabetes.
E o padrão de protetização mais utilizado em todo mundo é uma prótese montada em um encaixe, geralmente feito de fibra de carbono, que infelizmente, cerca de três quartos dos pacientes amputados de membros inferiores, tem problemas com mudanças de volume no coto, sudorese intensa, úlceras de pele, sendo esses problemas responsáveis por frequentes reajustes do encaixe da prótese, levando a um desconforto do uso do encaixe convencional.
Pacientes com membro residual (coto) curto também têm dificuldade em obter uma boa vedação por sucção do encaixe, resultando em próteses saindo do lugar, reajustes constantes entre outros. E é nesse ponto que surge a Osteointegração. Uma nova área na Ortopedia que oferece aos pacientes uma maneira de ter uma prótese, para aqueles que não conseguem utilizar uma prótese com encaixe tradicional.
Confira uma entrevista do Dr. Anderson Nolé com o Dr. Sylvio Cesar Sargentini, Médico Ortopedista, especialista em tumores ósseos, atua no Hospital de Amor de Barretos, explicando sobre a Osseointegração.
**Você pode assistir a entrevista na íntegra no vídeo acima.
Dr. Anderson: Qualquer pessoa que teve uma amputação pode fazer esse procedimento?
Dr. Sylvio: O procedimento da Osseointegração depende da estrutura do osso remanescente. Geralmente, os pacientes amputados tardiamente, por não estarem utilizando aquela estrutura óssea, o osso fica mais frágil, ou seja, o canal femoral, canal medular, do úmero ou da tíbia , fica alargado. Então esse osso precisa de uma avaliação prévia, sendo a tomografia um exame ideal. Com a tomografia poderemos ver tanto o comprimento quanto a qualidade da cortical óssea e a espessura desse canal porque isso faz a gente planejar o implante ideal para o paciente. Pacientes que sofreram amputação por infecção óssea, Osteomielite não são indicados para fazer a Osseointegração. Outras contraindicações: obesidade, diabetes e tabagismo. Lembrando que o paciente com obesidade, diabetes ou tabagismo pode trabalhar esses aspectos e poder ser elegível para fazer a Osseointegração
Dr. Anderson: Como ter acesso a esse tipo de implante? Qual o caminho até a cirurgia?
Dr. Sylvio: O primeiro passo para o paciente seria ele fazer uma tomografia do coto, para que seja feito um estudo desse coto, e verificar a compatibilidade com o implante. Feito os exames prescritos pelo médico responsável, e observado todos os requisitos, o paciente pode ser elegível para a cirurgia de Osseointegração.
Dr. Anderson: Nesse sistema, quais os pontos negativos?
Dr. Sylvio: Os pontos negativos são: para quem faz a prática de esportes na água pode ser um agravante. O tempo de exposição prolongado a água é um fator agravante. Ainda precisamos desenvolver um Liner para evitar o contato da água na região da exposição entre a prótese e o ambiente externo. Acredito que o risco de infecção é maior, sendo um ponto de risco, e também o risco de fratura no caso de uma queda. Mas, acredito que os benefícios são maiores.
Dr. Anderson: Ocorre o risco de inflamação?
Dr. Sylvio: A inflamação é constante. A osteíte e inflamação ao redor do material da prótese é constante. Por isso, na segunda etapa da Osseointegração, o material da parte externa, aquela onde vai se conectar com o joelho, recebeu um banho de prata específico. A prata é um agente antibacteriano. E a haste que é implantada no osso é de titânio, material que também reduz risco de inflamação.
Dr. Anderson: Quando aplicado esse sistema, quais as porcentagens de infecção óssea?
Dr. Sylvio: De acordo com a literatura, 20% o risco de infecção óssea. O nosso primeiro paciente implantado, Wanderson, não houve infecção, esperamos que não tenha.
Dr. Anderson: Existem risco de rejeição, infecção e secreção?
Dr. Sylvio: A secreção é constante, uma pequena quantidade de líquido que se forma ao redor da saída da haste, infecção e contaminação são conceitos diferentes. A infecção é ruim e a contaminação é constante, principalmente coagulase negativa. Rejeição eu entendo como ter que tirar a prótese, e é possível reverter o processo, numa eventual fratura, soltura do material, nós temos uma reversão. E aí o paciente volta a ter um coto normal.
Dr. Anderson: Pode correr, praticar esportes, exercícios físicos com a Osseointegração?
Dr. Sylvio: Eu falo para todos os meus pacientes, sendo os protetizados com osseointegração ou com encaixe tradicional, que a gente não coloca limites, principalmente pacientes oncológicos, porque o nosso intuito é reabilitar o paciente perto do máximo do que ele pode viver com qualidade. Porém, para fazer atividade física, o paciente terá que ter uma lâmina para poder ter uma melhor absorção de impacto, mas isso nós ainda temos que avaliar porque não é comum vermos quem fez osseointegração praticando corrida por exemplo, ou outros tipos de esportes.
Dr. Anderson: Quanto o procedimento em membro superior? Amputação a nível transumeral com prótese biônica.
Dr. Sylvio: A prótese que se conecta a osteointegrada, ela pode ser qualquer uma, eventualmente para membro inferior nós estamos priorizando próteses com sistema de amortecimento, a gente já entrou em consenso sobre isso. Ainda vou acabar fazendo próteses sem sistema de amortecimento, em nossos pacientes aqui do SUS, do Hospital de Amor, porque eu não tenho acesso a esses joelhos eletrônicos e com amortecedor. Agora com relação à osseointegração para amputação transumeral, é um projeto futuro, e nós vamos fazer com base no estoque ósseo do úmero do paciente, porque precisamos fazer algo planejado, específico para esse osso.
Dr. Anderson: Suporta carga como musculação? Sou amputado transtibial e meu coto é pequeno. Funcionaria pra mim?
Dr. Sylvio: Transtibial com coto pequeno, eu acredito que não, porque a tíbia tem um diâmetro muito largo na região proximal. Para poder fazer, teria que subir o nível da amputação para transfemural, se realmente a pessoa quiser fazer. Mas se o seu coto transtibial for funcional eu aconselho que não, precisa ser avaliado cada caso. Com relação a carga de musculação, é complexo você avaliar qual musculatura que você trabalharia ou que você trabalharia a mais com membro biônico, vamos dizer dessa maneira. Se você for fazer um exercício com uma extensora, por exemplo, poderia fazer independente do coto estar protetizado ou não. Acredito que musculação dá para fazer sim, é algo viável. Se o paciente se adaptar, fantástico. Claro que os exercícios tem que ser feito de maneira gradual.
Dr. Anderson: Pode usar qualquer modelo de joelho?
Dr. Anderson: A gente prioriza para o paciente de Osseointegração externa, sistemas de joelho que tenham “diminuição de tropeço”, pois esses joelhos, quando acontece do paciente tropeçar, ele enrijece e dificulta a queda desse paciente. Então ao meu ver hoje, as possibilidades de joelho que fazem isso são os sistemas de joelho eletrônico. Recentemente foi lançado um joelho mecânico hidráulico com sistema “antitropeço”, talvez seja uma alternativa. Eu tenho receio de colocar um sistema de joelho que não dê um suporte ao paciente, que não traga uma segurança completa. É claro que, toda indicação de prótese a gente segue a classificação K , que vai de K1 a K4, com relação ao grau de atividade do paciente, e todos os componentes da prótese seguem essa classificação. Então a gente tem que pensar nesse conceito no momento de prescrever a prótese, e o paciente osteointegrado, a gente tem que pensar no máximo de conforto e segurança dentro dos preceitos K.
** No vídeo acima, veja o primeiro paciente Bionicenter, Wanderson, a fazer a Osteointegração.
Dr. Anderson: Pessoas que praticam esportes de alto impacto podem fazer com a osseointegração?
Dr. Sylvio: Recentemente um paciente nosso que fez a Osseointegração, que inclusive salta de paraquedas, me perguntou se ele pode fazer esporte de alto impacto, e aí respondi que primeiro ele precisa se reabilitar, fazendo testes. Mas eu não recomendo impacto alto, porque a carga transmitida direto para o osso e o metal, pode ser muito perigosa, correndo risco de fratura.
Dr. Anderson: Qual é a forma de descarga de peso da extremidade óssea com a prótese?
Dr. Anderson: No momento da montagem da prótese osteointegrada, principalmente quando utilizamos os sistemas de joelho eletrônico, nós fazemos o alinhamento baseado nas linhas de cargas dos próprios componentes eletrônicos, que são pré-determinados e é fornecido pelos fabricantes desses componentes, porque se não estiver na linha correta, o joelho por exemplo, não funciona. Então para paciente transfemural, pegamos a linha de carga do trocanter maior do fêmur, essa linha tem que passar entre 1 cm a 1,5 cm a frente da linha do eixo do joelho. Isso tem que ser respeitado, como se fosse uma prótese tradicional com encaixe.
Dr. Anderson: Qualquer pessoa que teve uma amputação pode fazer esse procedimento da Osteointegração?
Dr. Sylvio: A escolha é individualizada. Neste momento estamos fazendo em amputações transfemurais, sendo que não é qualquer pessoa que pode fazer. Pessoas que sofreram a amputação por motivos de infecção não podem, pacientes que são obesos ou têm diabetes, temos que analisar cada caso, pois o risco de infecção é maior. Além disso, temos que fazer uma análise da estrutura óssea, através de uma tomografia.
Dr. Anderson: Esse procedimento é mais indicado para recém amputados ou uma pessoa que é amputada há 10 anos poderia fazer?
Dr. Sylvio – A prioridade é para recém amputado, pois ele tem a estrutura óssea preservada e ainda não passou pelo processo de reabsorção por falta de carga. Porém, não há impedimento que um amputado tardio possa fazer a osseointegração, desde que ele tenha todos os requisitos necessários.
Dr. Anderson: Quanto tempo leva para osteointegrar?
Dr. Sylvio: A Osteointegração no processo do Dr. Brenner Mark, que é um procedimento onde entra rosqueada, leva cerca de 6 meses para fazer a segunda etapa. Os nosso intuito foi mesclar os procedimentos, então o nosso paciente entra Press Fit, então a osteointegração pode ser considerada como imediata. A gente espera a cicatrização de todo tecido, só que como a haste entra através de pressão, a gente já pode liberar o paciente para a segunda etapa.
Dr. Anderson: Plano de saúde, cobre a osteointegração?
Dr. Sylvio: Os planos não cobrem, porém talvez se entrar com ação judicial, pode ser que consiga.
Dr. Anderson: Sou bilateral transfemoral, posso fazer?
Dr. Sylvio: Bilateral pode fazer sim. Cada caso é um caso, devemos analisar os requisitos, mas pode fazer sim.
Dr. Anderson: Paciente precisa tomar algum analgésico? A prótese intra óssea é colada?
Dr. Sylvio: Ela é osteointegrada, ela entra sob pressão, o osso se adequa a essa superfície do Titânio, e gruda. Remédios analgésicos, antiinflamatórios e antibióticos, eles devem ser prescritos por equipe médica. O paciente pode estar com uma dor e evidentemente pode tomar uma Dipirona ou Paracetamol. Antibióticos nós indicamos em pacientes com suspeita de alguma característica de infecção na ferida, e antiinflamatórios no caso do paciente ter utilizado a prótese durante muito tempo e estar com muita dor.
Dr. Anderson: Quantos pacientes no Brasil já receberam a osseointegração ?
Dr. Sylvio: Que eu saiba, na região Nordeste tem um paciente, e o Wanderson que está na segunda fase. Nós temos no hospital de amor, 10 pacientes já com a primeira fase,
** No vídeo acima, veja o primeiro paciente Bionicenter, Wanderson, a fazer a Osteointegração.
Dr. Anderson: Adolescente em fase de crescimento pode fazer?
Dr. Sylvio: Adolescentes em fase de crescimento podem fazer, e a gente leva em consideração, justamente a estrutura do fêmur proximal, que é capaz de crescer, e isso pode propiciar uma dificuldade futura, porque o coto vai ficando apertado, só que ele cresce acompanhando a pele. Mas esse paciente, ele vai demorar mais tempo, para iniciarmos a segunda fase, pois temos que esperar o término da fase de crescimento.
Dr. Anderson: O recobrimento proposto mitiga a ação bactericida no local?
Dr. Sylvio: Eliminar a ação de bactérias no local não acontece, mas diminui. A prata que recobre a prótese, pelos estudos que fizemos, durará em média 20 anos.
Dr. Anderson: Como o técnico vai fazer o alinhamento da prótese com Osseointegração?
Dr. Anderson: Após a segunda fase, a própria Osteomed (que é a empresa desenvolvedora das hastes) fez alguns alinhadores de translação, quanto de lateralização. Então a Osteomed fornece os adaptadores até chegarmos ao alinhamento do joelho.
** No vídeo acima, veja o primeiro paciente Bionicenter, Wanderson, a fazer a Osteointegração.
Gostou de saber sobre a Osteointegração? Para mais informações, entre em contato pelo nosso WhatsApp clicando no botão desta página e nos siga em nossas redes sociais Instagram, Facebook, Linkedin, TikTok